quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

filho 1.1

De madrugada fui visitada por Erato.
Infelizmente, talvez pelo cedo da hora, o resultado não é brilhante...  Mas é sincero!

Alexandre

És um tudo feito do nada que eu sou
Ao meu nada juntou-se o tudo da esperança
Que bailando no meu ventre me mudou
Com promessas de sorrisos de criança

Na barriga trouxe o milagre da orgânica
Nos meus braços sinto que embalo todo o mundo
E sendo esta uma tarefa titânica
Com os deuses e as deusas me confundo

Já há muito abandonaste o espaço
Que te oferecia sem nunca mo teres pedido
Embalo-te agora no regaço
E velo-te quando adormecido

Nos teus olhos vejo um mundo que é só teu
Com esperança e promessas renovadas
Deitas por terra o meu espírito que é ateu
Vejo todas as certezas abaladas

As tuas vontades agora são a lei
O teu sorriso a meta a alcançar
Todos os desejos que na vida eu calei
Sou agora capaz de confessar

Que nunca nenhuma lágrima tua deslize
Que o teu rosto não seja marcado pela dor
Que o mais pequeno sonho se concretize
Que vejas sempre a beleza em teu redor

Que as penas que são tuas sejam poucas
Que vejas a luz na escuridão
Que à inveja as tuas orelhas sejam moucas
Que oiças sempre a voz do coração

Que o teu sorriso seja uma constante
E o teu riso soe cristalino
Que não percas nem por um instante
Essa tua pureza de menino

Que atinjas sempre a excelência
Em todas as tuas atitudes
Que saibas escolher em consciência
Um caminho pautado por virtudes

E que um dia, quando fores velhinho
Sorrias ao lembrares-te de mim
Que me recordes sempre com carinho
Que saibas que te amei até ao fim

filho

6:10 da manhã... 
acordo com uma sucessão de "has" e "huns". 
abeiro-me da alcofa e sou imediatamente presenteada com alguns dos sorrisos mais rasgados que já vi na vida e com tentativas de gargalhar! 
o seu olhar, poisado no meu, é feito de amor, esperança, felicidade e confiança. 
mesmo sem me dar conta sorrio em resposta aos seus olhos brilhantes.  o primeiro sorriso do dia, ainda arrancado às remelas e ao calor da cama. 
respiro fundo e penso: "life is good!"

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Imaginação: A Espera

A casa, sempre silenciosa e quieta, ficava num rés-do-chão alto de um prédio antigo.  O prédio, dos primeiros a ser construído naquela rua, tinha mais três andares para além daquele.  Ao todo, oito famílias co-habitavam debaixo do mesmo tecto.  Quase todos viviam ali à bastante tempo, mais de trinta anos, sendo que os últimos a entrar naquela família haviam chegado à 9 anos, quase uma década.  Todos se tratavam pelo primeiro nome, e, de há uns tempos para cá, todos se preocupavam com a D. Ana Bela.
Ao entrar no prédio, irremediavelmente, lançavam um olhar para as janelas do rés-do-chão.  Mesmo que tentassem olhar para dentro de casa, o que era difícil pois os parapeitos ficavam acima da cabeça da maior parte dos habitantes do edifício, não conseguiriam ver nada pois os estores de plástico encontravam-se sempre fechados.  Pelas pequenas nesgas dos intervalos julgavam, por vezes, poder vislumbrar o olhar da idosa senhora, mas nenhum ruído ou movimento indicavam que alguém se encontrasse em casa.
As coisas nem sempre foram assim…  a casa da D. Ana Bela e do Sr. Jacinto era, por norma, o ponto de encontro de todos.  As reuniões da administração davam-se no apartamento decorado de forma aconchegante, onde a mais ínfima partícula de pó encontrava os dias contados.  Os aniversários da filha, Rosarinho, eram festejados por todos como se da sua própria filha se tratasse e, em tempos de aperto, sabiam que ao bater àquela porta saiam reconfortados.   Mas as coisas tinham mudado… 
Rosarinho abandonara-os há já vinte e sete anos.  A doença fragilizara-a e nem o apoio dos pais e do marido a tinham conseguido ajudar.  Na altura, a incógnita da maleita deixara, para além da tristeza e do desespero, uma enorme revolta no coração de todos.  Anos mais tarde ouviu-se falar em Lúpus, e tudo começou a fazer mais sentido.  Aos poucos e poucos todos retomaram a sua vida e a jovem tornou-se uma doce recordação na mente de todos, a lembrança de alguém puro e meigo que partira antes do seu tempo.  Só D. Ana Bela e o Sr. Jacinto pareciam, ainda, conviver diariamente com o espectro da filha.  O brilho no olhar de ambos apagou-se e as gargalhadas da mulher, outrora tão fáceis e límpidas que limpavam a alma de quem as ouvia, tornaram-se raras.  As festividades escasseavam.
Há 3 anos, por volta do Dia da Liberdade, Jacinto partira.  Ana Bela, de solitária, passou a só.  Nada havia de estranho neste abandono e todos sussurravam, longe dos ouvidos da viúva, “que é que querem?  Já era velho!”  Mas para Ana Bela, que o conhecera na frescura dos seus dezassete anos (contava ele vinte e três) sempre o vira como o jovem magro e garboso que a perseguira durante 11 meses, até ela aceder que ele pedisse ao seu pai, homem hirsuto e seco, permissão para a namorar.  Oito meses depois fazia dele seu marido.  E agora ali se via…  viúva e órfã de filha.
Aos poucos as saídas diminuíram, até cessarem por completo.  A luz do sol, que durante anos fora visita assídua do apartamento, encandeava-a com o seu calor, e mantinha-a longe com a ajuda dos estores e de pesados reposteiros.  Música, gargalhadas, até a voz dos outros, feriam-lhe os ouvidos por não trazerem consigo o timbre das vozes que ansiava.  O brio que sempre a guiara na gestão da casa parecia-lhe agora uma futilidade.  Ninguém entrava na casa, ninguém queria saber se o pó se acumulava, se as pratas eram areadas, se o ar era pesado, húmido e estagnado.  De noite, quando todos dormiam, ia por vezes ao contentor do lixo em frente ao prédio, sempre que um saco atingia a sua capacidade máxima.  Mas o ar fresco da noite parecia atingi-la como uma bala de obus.  A única coisa que a preocupava, ainda, era estar sempre impecavelmente vestida, calçada e arranjada.  Todas as manhãs, ao escolher um dos muitos fatos de pesado luto que formavam agora o seu guarda-roupa, passava a escova nas vestes negras, penteava-se com o esmero que Jacinto sempre lhe elogiara, colocava a pregadeira de sua mãe (sua única herança) ao peito e aguardava.  Esperava, assim, que quando finalmente a encontrassem, estaria pronta para se reunir a Eles.  Uma vez por semana, Mariana, a jovem de cinquenta e quatro anos, do piso de cima, levava-lhe as mercearias da semana.  E todas as semanas Ana Bela pensava “talvez seja desta”.
Mas a Morte passava na rua e, olhando para as janelas silenciosas e quietas, julgava a casa vazia.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Ideologias: Os filhos de Zeca?


Será este um indício que precisamos de canções de intervenção, uma vez mais, para acordar da apatia colectiva da sociedade portuguesa?





"Parva que sou" - Deolinda
Música e letra: Pedro da Silva Martins

Sou da geração sem-remuneração
e nem me incomoda esta condição...
Que parva que eu sou...

Porque isto está mau e vai continuar
já é uma sorte eu poder estagiar
Que parva que eu sou....

e fico a pensar
que mundo tão parvo
onde para ser escravo
é preciso estudar...

Sou da geração casinha-dos-pais
Se já tenho tudo, pra quê querer mais?
Que parva que eu sou...

Filhos, marido, estou sempre a adiar
e ainda me falta o carro pagar
Que parva que eu sou...

e fico a pensar
que mundo tão parvo
onde para ser escravo
é preciso estudar...

Sou da geração vou-queixar-me-pra-quê?
Há alguém bem pior do que eu na TV
Que parva que eu sou...

Sou da geração eu-já-não-posso-mais-Que-esta-situação-d­ura-há-tempo-de-mais!
e parva eu não sou!!!

e fico a pensar
que mundo tão parvo
onde para ser escravo
é preciso estudar...

pensamentos soltos

"Internet: Um terço dos utilizadores na UE apanhou vírus em 2010, Portugal entre os mais afetados

12 de Fevereiro de 2011, 16:34

Lisboa, 12 fev (Lusa) -- Perto de 31 por cento de utilizadores da internet na União Europeia apanharam, pelo menos, um vírus no computador durante o ano de 2010, com Portugal entre os países mais afetados, com 37 por cento.
De acordo com um estudo do Eurostat, o gabinete estatístico da União Europeia, "quase um terço dos indivíduos que realizaram pesquisas na internet ao longo dos 12 meses do ano informaram que apanharam um vírus no computador".
Portugal apresenta valores que superam em seis por cento a média dos 27 Estados-membros, apesar de 86 por cento dos utilizadores portugueses utilizar 'anti-vírus', valor que ultrapassa, ainda que de forma ligeira, a média europeia em matéria de segurança, de 84 por cento."

Até cibernauticamente ficamos a perder!  É impressionante como nos "contagiamos" com tudo o que não queremos e parecemos estar vacinados contra aquilo que nos faz falta!

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Imaginação: Perspectivas

Não há nada como acordar com uma carta, da pessoa certa, à nossa espera…

“Dear John


Há coisas que, de tão importantes, devem ser ditas por carta, de forma a termos a certeza que chegam claramente a quem se dirigem.  Dizem que as cartas de amor são ridículas…  talvez as de desamor sejam respeitáveis.  O amor, acabei por o descobrir mais tarde do que esperava, não é o sentimento egoísta e castrador que sinto por ti  ou sentia.  O amor é um sentimento nobre, avassalador, que não conhece limites.  Quando te conheci era uma miúda, sem saber nada da vida, cada dia era uma descoberta sobre mim mesma, uma aventura.  Foi uma fase confusa e desesperante que agora, em retrospectiva, agradeço ter vivido.  Ter-te conhecido nessa altura permitiu que te recebesse de braços abertos, quase grata, na minha vida.  Mas, à luz da pessoa que me tornei, uma pessoa que ainda que por vezes não goste adoro poder ser,   vejo que foi um tolo erro de criança quase mulher.  Como a compra precipitada de um par de calças que nunca se chega a usar.  A culpa não é tua.  Tu continuas a ser a mesma pessoa que eras há 15 anos atrás.  Talvez o problema seja esse!  Eu já não sou a mesma pessoa!  As minhas prioridades mudaram.  O mais importante para mim já não é o ser aceite…  É o ser verdadeira comigo mesma e com a pessoa que sou.  E, quando sentimos que mudamos, já não há nada a fazer senão aceitar essa mudança, crescer e aprender com ela e, no meu caso, escolher um novo caminho.  Por muito que deseje manter as coisas na mesma rotina (e, na verdade, não o desejo), não consigo viver mais tempo esta mentira.  Acordo agoniada pela realidade que me rodeia e anseio, mais que tudo, cortar as amarras que me prendem a um passado que já não quero.  Continuar esta mentira é acabar por te odiar e por me anular a cada dia que passa …  não quero mais sentir-me assim…  presa, amordaçada, morta para a vida.  Por isso parto…  para que aquilo que vivemos não se torne, para mim, um erro de proporções bíblicas e possa continuar a ser uma doce memória de infância.

Sara”

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Ideologias: Quem diz a verdade...


Quem diz a verdade...  Não merece castigo???

Imaginação: Percursos

O ar estava frio…  Um daqueles dias frios em que ar parece estalar nos ouvidos.  Sandra e Luísa sentavam-se, frente  a frente, na esplanada do café, voltadas para o mar.  Era um daqueles dias de Inverno em que, teimosamente, o sol brilha sem deixar, no entanto, o seu manto confortável de calor.  Um dia belo em que as expirações transformavam-se em vapor em frente à boca.  Um dia em que mulheres, como as duas amigas , só se aventuravam a uma esplanada se a estética pessoal não se melindrasse com um nariz vermelho.
O empregado de mesa aproximou-se silenciosamente das duas mulheres, uma bandeja redonda magistralmente equilibrada na ponta dos dedos, e colocou em frente a cada uma o pedido feito à chegada.  Sandra engoliu a sua italiana, sem açúcar, de um só trago.  Só assim sentia o sabor explosivo do café a aquecer-lhe o corpo e o espírito.  Luísa verteu o conteúdos de dois pacotes de açúcar no seu cappucino.  Um cappucino extremamente doce era a sua forma de se sentir parte integrante do ritual do “cafezinho” que todos os seus amigos pareciam ter mas que, com muita pena sua, não lhe agradava ao palato.
- Há quanto tempo não vínhamos aqui?
Luísa levantou os olhos da bebida antes de responder.
- Julgo que desde o dia em que viemos consolar a Rita, quando o Joel saiu de casa com a roupa numa mala e a chave de casa da Renata no bolso…  Agosto, se não me engano…  Já lá vão 3 meses.
Sandra acenou com a cabeça.  Sim.  Devia ser desde aí.  Também fora a última vez que vira Rita.
- Devíamos nos esforçar para fazer isto mais vezes, não achas?
Claro que acho, pensou Luísa.  Mas o dia só tem 24 horas.  Oito das quais passamos a trabalhar em horários diferentes.  Tu e eu.  Folgas em comum…  Muito raras.  É o que acontece a quem trabalha por turnos e não sabe o que é passar os fins-de-semana (des)contraidamente a passear pelos shoppings de Portugal.  E, para além disso, eu tenho filhos…  tu tens as tuas viagens ao estrangeiro, pagas a crédito, duas vezes por ano.
- Pois devíamos.
Desviou os olhos para o areal.  Alguns cães aproveitavam a liberdade do Inverno para passear os donos na praia.  O vento e o mar depositavam na areia montinhos de espuma espessa.  A espuma que faltava ao cappucino.
- Amanhã faz 4 anos que me juntei com o Filipe.
Luísa voltou o olhar para a amiga.
- Já?  Quatro anos?
- Sim…  Quem diria.
Uma gargalhada seca e um encolher de ombros…  Quem diria?!?
- Ainda me lembro do dia em que saí de casa para ir viver com o Pedro.  Chorei todo o caminho da casa dos meus pais à nossa…  Os onze quilómetros todinhos. 
Sandra franziu o sobrolho.
- Choraste?  Porquê?
- Porque se acabava uma fase da minha vida…  Porque dizia adeus à minha casa de infância.
Sandra varreu o horizonte com os olhos.  Quem seriam os loucos que iam para o mar com aquele frio?  Quem se atrevia, desta forma, a lutar com as ondas gélidas num pequeno barco?  Ainda perdida no horizonte confidenciou:
- Eu fui o caminho todo a rir, a cantar e a brincar com o Filipe.
Luísa sabia ser esta a sua deixa.
- Porquê?
- Porque se acabava uma fase da minha vida…  Porque dizia adeus à minha casa de infância.
Luísa poisou a chávena.
Ainda não fora esta cafeína que a aquecera.

"Existe algo mais importante do que a lógica: a imaginação. Se a ideia é boa, a lógica deve ser atirada pela janela."

(Alfred Hitchcock)